Paris perece...

Não podemos imaginar escassez neste mundo moderno de abundância. Muitas vezes, as gerações mais novas admiram a forma como os seus antepassados viveram com recursos limitados e ainda assim chegam a recordar os velhos tempos com ternura. É que eles viviam com fé ou, pelo menos, não ofendiam Deus. Seria errado infligir dor ao Eterno Provedor. Enquanto Ele dá alegria aos que nele creem, os que acreditam em si próprios e se divertem noite e dia acabam por não ver a luz ao fundo do túnel.

As leituras de hoje convidam-nos a confiar muito especialmente na Divina Providência, independentemente das circunstâncias. A Primeira Leitura (2 Reis 4: 42-44) mostra-nos como Eliseu, com apenas vinte pães de cevada, alimentou cem esfomeados. Era a promessa do Senhor, cumprida depois de o profeta lhe ter manifestado a sua total devoção. E o milagre simboliza o facto de nada ser impossível a Deus: Ele conhece e satisfaz todas as nossas necessidades e, sobretudo, as espirituais, dos que anseiam pela Palavra de Deus.

Embora sempre a leitura do Antigo Testamento se encontre coordenada tematicamente com o texto do Evangelho, neste domingo essa ligação fica claríssima. Ambas as leituras falam da multiplicação dos pães. Do Antigo Testamento vemos como Deus dá pão aos israelitas que passam fome no deserto (Ex 16: 4) e como Elias cria uma fonte inesgotável de farinha e de azeite para sobreviver à fome (Reis 17: 15-16); mas nem um nem outro desses exemplos se assemelha à história do Evangelho de hoje (Jo 6: 1-15).

Relatos evangélicos

Há seis relatos evangélicos sobre a multiplicação dos pães. Jesus alimentou duas vezes o povo – de uma vez, 5.000 comeram de cinco pães e dois peixes, e sobraram doze cestos daqueles; e noutra ocasião, 4.000, com sete pães e alguns peixes, e sobraram cinco cestos. Aquele é o único milagre (para além da Ressurreição) que se encontra registado nos quatro Evangelhos; e apenas Mateus e Marcos, sob pena de repetição, registaram ainda o segundo.

Este milagre realça a sensatez de uma abordagem sobrenatural, mesmo quando se trata das nossas necessidades materiais. É da essência confiar no Senhor, que disse: “Não vos preocupeis, dizendo: ‘Que comeremos, que beberemos, ou que vestiremos? Os pagãos, esses sim, afadigam-se com tais coisas; porém, o vosso Pai celeste bem sabe que tendes necessidade de tudo isso. Procurai primeiro o Reino de Deus e a Sua justiça, e tudo o mais se vos dará por acréscimo. Não vos preocupeis, portanto, com o dia de amanhã, pois o dia de amanhã já terá as suas preocupações. Basta a cada dia o seu problema. (Mt 6: 31-34).

É claro que todos os nossos problemas terminam à Mesa da derradeira refeição que Jesus nos ofereceu: a Sagrada Eucaristia. Isto acontece em cada Sacrifício da Missa. A multiplicação dos pães prefigurava o exemplo supremo de amor de Nosso Divino Senhor e Mestre, instituído na Última Ceia. Por isso, foi muito doloroso ver tudo isso parodiado na cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos em Paris na última sexta-feira.

Pouco importa que o desfile tenha sido fora do contexto do desporto; e seria um eufemismo dizer que ele foi de mau gosto. A vaidade em desfile traiu a memória de Carlos Magno e foi uma afronta à religião que moldou a França. O rei dos Francos, que se esforçou pela união dos povos cristãos, foi considerado o “Pai da Europa”, e o seu país chamado a “filha mais velha da Igreja Católica”. Assim, o que se passou em França no dia da semana em que Cristo morreu é nada mais nada menos do que pecado nacional que clama aos céus por vingança.

Paris ou perecimento?

A unidade da Europa cristã, tão desejada por Carlos Magno, foi uma reprodução fiel do que São Paulo, séculos antes, havia querido em relação à Igreja. Na Segunda Leitura (Ef 4: 1-6), o Apóstolo dos Gentios implora ao seu povo que leve uma vida digna da sua vocação: “Existe uma só esperança na vida a que fostes chamados. Há um único Senhor, uma única fé, um único baptismo. Há um só Deus e Pai de todos, que está acima de todos, actua em todos e em todos se encontra”. Sim, em nós e em França. Infelizmente, a nossa reacção foi pobre, trágica, e as consequências não podem ser diferentes; é uma questão de justiça sobrenatural....

No entanto, quaisquer que sejam os problemas que enfrentamos, individualmente, como nação ou como civilização, eles nunca são demasiado grandes para Deus. Assim, quando multiplicamos os problemas, Deus multiplica as soluções; quando multiplicamos as maldições, Ele multiplica os julgamentos; e ainda, quando multiplicamos as orações, Deus multiplica as bênçãos. Igualmente oportuno é notar o lema de Carlos Magno: In Scelus Exsurgo Sceleris Discrimina Purgo (“Luto contra a agressão e castigo o agressor”).

A paródia parisiense é a Revolução Francesa em modo loop. A revolução continua, destinada contra a Igreja Católica. Todas a reconhecem, menos os católicos! Somos talvez os únicos que gozam livremente com a própria Mãe, a Igreja. Quem se atreveria a tentar estas palhaçadas contra outras religiões? Devemos perdoar mesmo quando a nossa Mãe está a ser atacada? Já nada é sagrado?

Será que Roma e a Igreja em França e em todo o mundo vão então condenar formalmente esta situação? E tu e eu? Será que vamos aceitar estupidamente, mais uma vez, que o inimigo tem razão e que só nos resta dizer “Touché”?

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https://www.foxnews.com/media/olympics-opening-ceremony-sparks-outrage-drag-queens-parodying-last-supper-gone-completely-woke 


Gestão apostólica

Nas leituras de hoje, vemos os primórdios do ministério cristão. Este tinha por trás o peso de uma tradição plurissecular traçada originariamente para o povo eleito. Israel, porém, não correspondeu ao chamamento e, por isso, Deus enviou à terra o seu Filho único para cumprir a sua missão, pois “O mesmo sucede à palavra que sai da minha boca", diz o Senhor, "não voltará para mim vazia, sem ter realizado a minha vontade e sem cumprir a sua missão" (Is. 55: 11).

Na Primeira Leitura (Am 7: 12-15), vemos Amós, pastor de ovelhas e produtor de figos de sicómoro, de Teqoa, opor-se às instruções do sacerdote idólatra do templo, Amazias, para fazer vista grossa à arrogância e à injustiça do rei Jeroboão II. Em vez disso, Amós denuncia esses males. No santuário real de Betel, então, acusam-no de conspiração política contra o rei. Amazias, saindo em defesa dos interesses da Coroa, proíbe Amós de profetizar contra Israel e expulsa-o da terra. É assim que o poder instituído actua contra Amós, que fazia questão de proclamar a Palavra de Deus em toda a plenitude.

A disputa de Amós com Amazias é fundamental para compreender não só a missão de Amós, mas a de todos os profetas. Não se trata apenas de uma página do passado, mas de um eco da realidade dos nossos dias. Quantos leigos e responsáveis eclesiásticos têm a coragem de defender a Igreja e a comunidade? Quantos de nós estão prontos a enfrentar indivíduos e governos, filosofias mundanas e correntes políticas? Quantos defendem os valores do Evangelho e anunciam a Palavra de Deus com liberdade, franqueza e sem medo?

No Evangelho (Mc. 6: 7-13), Jesus retomou o ponto em que o sistema judaico tinha parado, rejeitando o plano de Deus. Farto de chefes cobardes, ingratos e falsos, Jesus prepara a liderança apostólica. Não exige fanfarra, mas simplicidade; não procura dinheiro, mas dedicação; não haveria padrinhos, mas apenas Deus Pai. Chamou os Doze e enviou-os dois a dois, segundo o costume judaico, para que pudessem não só ajudar-se um a outro, mas também ser testemunhas segundo a lei.

No entanto, Jesus não se prendeu às leis do mundo, mas moveu-Se pela graça. Deu aos apóstolos poder sobre os espíritos impuros, exortou-os a não se ligarem a qualquer forma de mundanismo. Tal como Amós, que tinha deixado claro que não era um profeta "profissional" ou remunerado, Jesus "ordenou-lhes que não levassem nada para o caminho, a não ser somente um cajado; nem pão, nem saco, nem moedas na cinta; mas que fossem calçados com sandálias. E acrescentou: ‘Não leveis duas túnicas’".

Jesus reforçou o espírito apostólico com directrizes ousadas. Quando os apóstolos chegassem a uma cidade, deviam procurar uma casa hospitaleira. Se um lugar não os recebesse ou se recusassem a ouvi-los, deviam sacudir o pó dos pés (um ritual que os próprios judeus praticavam quando regressavam de terras pagãs) "como testemunho contra eles". Para Jesus, os judeus que não recebessem a Boa Nova eram de facto pagãos! E era um ‘testemunho contra eles’, no sentido de que só eles seriam responsáveis pelo julgamento que lhes sobreviria, mais terrível do que o de Sodoma e Gomorra.

Em outro lugar dos Evangelhos, temos uma lição de diplomacia resumida para nós, a Igreja contemporânea: "Envio-vos como ovelhas para o meio de lobos; sede, pois, prudentes como as serpentes e simples como as pombas" (Mt. 10: 16). Isto ensina-nos que os cristãos não devem comportar-se como gado a caminho do matadouro; e a Igreja deve deixar de se flagelar por acusações feitas fora do seu contexto histórico. Por isso: “Seja este o vosso modo de falar: Sim, sim; não, não. Tudo o que for além disto procede do espírito do mal" (Mt. 5,37). Ao mesmo tempo, recorda-nos S. Paulo: "Fiz-me fraco para os fracos, para ganhar os fracos. Fiz-me tudo para todos, para salvar alguns a qualquer custo" (1 Cor. 9: 22).

Por isso, os cristãos devem ser sábios, diligentes e viver da graça divina. O Apóstolo dos Gentios, na Segunda Leitura (Ef. 1: 3-14) de hoje, diz-nos muito particularmente que Deus nos escolheu ainda antes da criação do mundo, para sermos seus filhos adoptivos por Jesus Cristo, como aprouver à sua vontade e para a glória de Deus. Este verso é considerado um hino jubiloso a Deus pelo seu plano maravilhoso concentrado em Cristo e os seus Apóstolos. Assim, a gestão apostólica torna-se parte integrante do plano salvífico de Deus. Todos nós fazemos parte disto; todos nós somos apóstolos!


Discernir o Profeta

Por que é que Jesus, no Evangelho de hoje (Mc 6, 1-6), diz: "Um profeta só é desprezado na sua terra, entre os parentes e em sua casa"?

Depois de ter deixado a casa de Jairo (ver o Evangelho do domingo passado), Jesus empreendeu uma missão pela Galileia, pregando em todas as pequenas aldeias daquela terra. Foi para a sua antiga casa em Nazaré e, no sábado, começou a pregar na sinagoga. Infelizmente, foi recebido com frieza. Em vez de apreciarem e agradecerem a Deus a dádiva do seu divino conterrâneo, os nazarenos menosprezaram-no, dizendo: "Não é Ele o carpinteiro, Filho de Maria e irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão? Não vivem aqui entre nós as Suas irmãs?

Quando as pessoas de bem são rejeitadas, isso pode acontecer por simples falta de seriedade ou por malícia do outro lado. Ou não os damos importância ou os invejamos. Consideramo-los iguais a nós, nada melhores do que nós. Parecem-nos vulgares, incapazes de fazer algo de bom. E quanto melhor os conhecemos, mais provavelmente acharemos neles alguns defeitos. Em suma, olhamo-nos com desdém, pois santo de casa não faz milagre.

Essas situações são muito dolorosas, mas são os caminhos do mundo, dos quais não há melhor resumo do que as palavras do Divino Mestre. Note-se, no entanto, que, enquanto S. Marcos usa uma dupla negativa em "Um profeta não é sem honra, exceto na sua terra...", S. Mateus (13: 57) diz directamente: “Um profeta só é desprezado na sua pátria e em sua casa".

Já reparou como os bem-intencionados são alvo de escrutínio enquanto os enganosamente agradáveis são colocados num pedestal? Foi o que aconteceu no tempo do profeta Ezequiel, que foi enviado ao povo de Israel, uma nação de rebeldes, impudentes e teimosos, que muitas vezes se tinham voltado contra Deus. No entanto, Deus, no seu infinito amor e misericórdia, não os abandonou; enviou-lhes o seu profeta, quer ouvissem ou não. Um dia, aperceber-se-iam de que no seu meio haviam tido um profeta.

Ao longo dos tempos, centenas de santos enfrentaram a rejeição da família e de amigos. De facto, muitas vezes Deus permite que sejamos testados desta forma; é como o ouro a passar pelo fogo da purificação. Diz o falecido escritor brasileiro, Professor Plínio Corrêa de Oliveira: “Porém, Ele costuma provar a confiança de seus servos. Quando isto lhe acontecer, não se suponha abandonado… Quando tudo parecer perdido ou comprometido, aí virá a solução”.[1]

Qual deve ser a nossa atitude numa situação destas? Temos de estender a mão aos outros, no que for preciso. Como diz o mesmo zeloso escritor católico na sua Via Sacra: “Em meu apostolado, Senhor, deverei continuar mesmo quando todas as minhas obras estiverem por terra, mesmo quando todos se conjugarem para atacar-me, mesmo quando a ingratidão e a perversidade daqueles a quem quis fazer bem se voltem contra mim”.[2]

É este também o espírito de São Paulo que, na Segunda Leitura de hoje (2 Cor 12, 7-10), afirma: “É, pois, da melhor vontade que porei a minha glória sobretudo nas minhas fraquezas, para que a força de Cristo se estabeleça em mim. Por amor é que sinto prazer nas fraquezas, nas afrontas, nas adversidades, nas perseguições e nas angústias sofridas por Cristo. Pois, quando me sinto fraco, então é que sou forte".

São esses os verdadeiros profetas. Do mesmo modo, todos nós que recebemos os dons baptismais de sacerdote, profeta e rei, não devemos fazer concessões baratas, seja nas nossas conversas, nas nossas escolhas, no nosso vestuário, na companhia que mantemos, naquilo que pensamos e ensinamos. Não devemos desnaturar a Igreja e, com a nossa conduta, dar a entender que já não há nada de sagrado. Por fim, não devemos ter sentimentos de desprezo ou inveja, pois alguém pode muito bem ser uma dádiva de Deus.

Dito isto, devemos apenas estar atentos aos frutos que uma pessoa produz, pois, muito tragicamente, há aqueles que distorcem a natureza do mandato evangélico, fogem às suas responsabilidades e, pior ainda, dão contra-testemunho e escândalo de mau exemplo. Sobre eles, Jesus fez esta advertência: "Acautelai-vos dos falsos profetas, que se vos apresentam disfarçados de ovelhas, mas por dentro são lobos vorazes". (Mt 7, 15)

O Papa Paulo VI, na sua Exortação Apostólica Evangelii nuntiandi, afirma: "O homem contemporâneo escuta com melhor boa vontade as testemunhas do que os mestres, dizíamos ainda recentemente a um grupo de leigos, ou então se escuta os mestres, é porque eles são testemunhas… Será pois, pelo seu comportamento, pela sua vida, que a Igreja há de, antes de mais nada, evangelizar este mundo; ou seja, pelo seu testemunho vivido com fidelidade ao Senhor Jesus, testemunho de pobreza, de desapego e de liberdade frente aos poderes deste mundo; numa palavra, testemunho de santidade.” (EN n. 41)

Assim, o verdadeiro desafio atual é separar o trigo do joio e discernir o verdadeiro profeta. Se este não marcar pela autenticidade, a maré passará da admiração e da simpatia à incredulidade e/ou à rejeição, e por ela não serão responsáveis nem Deus nem o povo, mas o tal profeta.

 

[1] https://www.pliniocorreadeoliveira.info/OUT_001960_conselhosvidaintelectual.htm

[2] https://www.pliniocorreadeoliveira.info/1951_003_CAT_Via_Sacra_CAT.htm


Passando da morte para a vida

É realmente uma questão de vida e morte. Surgem nas leituras de hoje todas as questões com que nos deparamos quando pensamos na vida – incluindo a questão da morte. A vida e a morte estão tão indissociavelmente ligadas que diríamos que a morte é um dos grandes acontecimentos da vida. E, para nós, cristãos, é uma questão de esperança, pois faz da morte uma vírgula, não um ponto final; a vida continua quando atravessamos para a outra margem, onde nos espera a visão beatífica.

É, pois, muito simbólico que Jesus, no texto evangélico (Mc 5, 21-43) de hoje, tenha atravessado de barco para a outra margem, tendo aí entrado Jairo, que outrora procurara Jesus no caso do centurião romano. Desta vez, temia pela sua filha, que estava à beira da morte. O chefe da sinagoga caiu aos pés de Jesus, admitindo assim a divindade do Mestre. De facto, quando Jesus chegou a casa dele, a menina já tinha morrido. Por quê esse “atraso” da parte de Jesus? Não só os discípulos acharam inútil que Ele fosse a casa de Jairo, como até o povo se riu d'Ele por ter dito que a criança "não morreu, está a dormir".

Claro, o Autor da Vida é que sabia melhor. Disse: "Talitha, cumi: Menina, Eu te ordeno: levanta-te!" e a menina de doze anos ergueu-se e começou a andar. Observa o Evangelista como todos "se encheram de pasmo"… Também connosco se passa isto, porém, receamos falar da morte, como se ela fosse o fim e não a continuação da vida! Ignoramos a exortação de Jesus, "Não tenhas receio. Crê somente", e por vezes não acreditamos; mas nem por isso deixamos de temer. Não é de admirar que pensamentos horríveis nos assaltem.

O poeta britânico Wilfred Owen, inquietado com a morte na guerra de um jovem colega soldado, escreveu "Futility" (Futilidade). Eis a sua pergunta: "Foi para isso que o barro tomou forma?" Sim, humanamente falando, é natural querer afastarmos da morte; por outro lado, como podemos deixar de ver a sua inevitabilidade? Aceitá-la seria ganhar metade da batalha; e logo, vendo como a morte é certa, embora incerta a hora, começaríamos a confiar e a alegrar-nos no Senhor. Ele é o Alfa e o Ómega; o Caminho, a Verdade e a Vida. "Eu sou a Ressurreição e a Vida", disse Ele, "aquele que crê em Mim, ainda que morra, viverá" (Jo 11: 25-26). É por isso que, no Credo, afirmamos: "Creio… na comunhão dos santos, na remissão dos pecados, na ressurreição da carne e na vida eterna". Note-se: "Creio" e não "Temo"!

Esta é a Boa Nova da Salvação, a verdadeira sabedoria. E a Primeira Leitura, tirada do Livro da Sabedoria (1, 13-15; 2, 23-24) esclarece que "não foi Deus quem fez a morte, nem Ele se alegra de os vivos perecerem... Deus criou o homem para ser incorruptível e fê-lo à imagem do que Ele é em Si mesmo. A morte entrou no mundo pela inveja do demónio, e os seus partidários sentem-lhe os efeitos".

Ou seja, Deus não destinara o homem para a morte; contrária aos planos de Deus Criador, entrou no mundo através do Pecado Original. (Cf. Catecismo n.º 1008). Essa obra dos nossos primeiros pais trouxe-nos indescritíveis sofrimentos. Sem dúvida, há muito de bom no mundo, mas também muito sofrimento; por isso, a morte não deixa de ser um alívio – "um remédio", como lhe chama Santo Ambrósio!

No entanto, tal como Job, estamos sempre perante a questão da vida e da morte. Dada a nossa fraqueza, não conseguimos lidar com ela com confiança. Por isso, o melhor seria fazer um balanço positivo, louvar a Deus e confiar mais Nele do que no mundo. Em cada momento da nossa vida, Ele resgata-nos do mal, como fez com a mulher hemorrágica do Evangelho, a qual tocara nas suas vestes com profunda fé. Temos de admitir que, com o pecado, a ingratidão se insinuou na natureza humana: cega-nos para a verdade, porém, como diz o Salmo, é Deus que nos ajuda sem cessar e converte o nosso luto em exultação.

O segredo de uma vida sábia e feliz reside, portanto, em acreditar e confiar no Senhor que fez o Céu e a Terra; e em socorrer os nossos irmãos menos afortunados, preocupando-nos pelo seu bem material e espiritual. São Paulo, na Segunda Leitura (II Cor 8: 7, 9, 13-15), sublinha que a nossa riqueza na fé, na eloquência, no conhecimento da doutrina, em toda a espécie de atenções e na caridade deve ser acompanhada da generosidade. De Nosso Senhor diz que, "Ele, que era rico, fez-se pobre por vossa causa, para que vos tornásseis ricos pela sua pobreza".

Não importa coisa alguma do que possa parecer contradição para os sábios deste mundo; devemos é evitar que os nossos pensamentos sejam terrenos. De facto, para nós, que acreditamos n'Ele, a zombaria ou a pobreza que sofremos é garantia da bem-aventurança e das riquezas que um dia viremos a gozar. Quando morremos para o mundo, nascemos para o Céu. É literalmente uma questão de vida e morte.